De Renato Capper : “O que você acha do que a Natália Pasternak disse sobre a psicanálise, que ela é uma pseudociência?”
Francisco Daudt: Acho que só temos a lhe agradecer: ela funcionou como o menino da fábula que disse “o rei está nu”. Ela nos fez um grande bem quando botou o dedo num assunto precioso para quem é psicanalista e tem aspirações iluministas e racionais: que tipo de conhecimento é a psicanálise?
Se há um reparo a fazer no que ela disse, seria que a psicanálise não é, nem pode ser (pelo menos por enquanto) uma ciência. Eu quero que ela seja uma protociência, um conhecimento que ambiciona ser científico, mas ainda não pode ser, dada a complexidade da mente humana.
Algo como um dia foi a alquimia, a primeira tentativa de abordar aquilo que se tornou a química: ainda muito em fase de observação, experimentação e hipóteses, algumas (ou muitas) viagens na maionese, algumas (ou muitas) embriaguezes delirantes, mas… com alguns (ou poucos) pesquisadores - nos quais me incluo - com genuíno desejo iluminista de razão, de lógica, e da humildade própria ao espírito científico: ainda não sei se o que observo é verdadeiro ou falso, mas quero muito saber, quero muito testar, quero muito dar a cara a tapa.
Esse “dar a cara a tapa” é o princípio de Karl Popper, meu filósofo da ciência predileto. Ele dizia que, no método científico, as hipóteses precisam estar vulneráveis à refutação, a que lhes apontem os erros: se elas forem sobrevivendo a essa peneira, têm chances de ser verdadeiras, mas… continuarão como alvo de questionamento, nunca se afirmarão como verdades absolutas.
Ele foi o legado de Freud: ele, no final da vida, foi deixando de lado o “Freud explica” em favor do “Freud investiga”; deixando de lado as interpretações para, como diz o título de um de seus últimos trabalhos, “Construções em análise”.