terça-feira, 21 de maio de 2024
APRESENTANDO O BETO AI
VÍCIOS: O PODER DO GATILHO
segunda-feira, 13 de maio de 2024
DOMÍNIO-SUBMISSÃO, O VÍCIO DO MIMADO
“DEPOIS, DEPOIS…” : O VÍCIO DA PROCRASTINAÇÃO
terça-feira, 30 de abril de 2024
PSICANÁLISE QUE NINGUÉM ENTENDE - O AMIGO PERGUNTA
De Leandro Alves de Siqueira: “Vi que existe entre os psicanalistas uma espécie de gozo no falar difícil e no não entendimento. Mas não é um contrassenso?”
Francisco Daudt: Leandro, as nossas ações são complexas, multideterminadas, mas existe esse componente, um certo complexo de inferioridade na psicanálise: diante da dificuldade de se entender a psiquê humana, e frustrada por sua impotência, a pessoa pode se sentir atraída a se dedicar mais ao confeito do que ao bolo; mais às firulas do que à substância; mais à espuma que ao chope; mais ao rito do que ao significado; mais à forma que ao conteúdo; mais à erudição que à sabedoria.
Tenho muita compaixão pelo aspirante a psicanalista que ambicionava entender os segredos da mente, mas quando chegou ao curso de psicologia (ou à formação analítica) se deparou com uma enxurrada de conhecimentos esotéricos, que o deixavam perplexo.
Imagino-o sempre a se perguntar, “mas então é isso? Eu não estou entendendo nada, então… o errado devo ser eu, eu devo ser meio burro”. E a partir daí, começou um processo de se adaptar, de aderir, de aprender a falar difícil, de ter o gozo de passar a perplexidade adiante, de não ser mais a vítima dela, mas seu causador.
Eu mesmo escapei por pura sorte dessa arapuca: eu era médico clínico havia cinco anos quando resolvi ser psicanalista. Não precisei cursar psicologia, portanto. Estive prestes a fazer uma formação com analista kleiniano, mas o destino me pôs diante de um freudiano formado na Argentina pelo Angel Garma (que tinha se formado com o Theodor Reik, formado por sua vez pelo próprio Freud). Foi desse jeito que me tornei um “freudiano de quarta geração”, em linha direta com o velho professor austríaco.
Assim, minha base teórica principal foi Freud, e ele fala língua de gente: eu entendia tudo. Ainda por cima, coordenei por dez anos grupos de estudo de Freud, e não tem melhor jeito de aprender que ensinar.
É daí que vem minha mania de ser claro.
quinta-feira, 25 de abril de 2024
"A COISA MAIS DURA QUE OUVI EM TODA MINHA VIDA" - O AMIGO PERGUNTA
“Ela tinha sido enganada pelo cara depois que ele a engravidou: ele disse que se ela abortasse, ele se casaria com ela, que ele só não queria mais filhos. Pois bem, ela abortou e ele lhe deu um pé na bunda.
Eu era seu amigo e fiquei devastado, solidário a ela. Dei-lhe todo o apoio, carinho e consolo que pude, eu gostava dela. Eu sei é que ela finalmente olhou para mim, pareceu gostar de mim, e acabamos por nos casar. Ela engravidou logo. Eu sempre quis ser pai, não podia estar mais feliz, e pensei que a gravidez de nossa filha também fosse lhe curar as antigas dores.
Mas algo estranho ocorreu: desde a gravidez e mesmo depois que nossa filha nasceu, meses se passaram sem que ela me permitisse qualquer aproximação sexual. Eu tentava conversar a respeito, mas nada.
Finalmente ela veio falar comigo: 'Fiquei pensando no porquê do meu afastamento, e concluí que foi o seguinte: quando você me engravidou, você tirou toda a possibilidade de um dia eu voltar para o fulano (o tal que a tinha enganado). Isso fez com que eu não quisesse mais que você nem chegasse perto…'
Foi a coisa mais dura que ouvi em toda minha vida.”
Francisco Daudt: Posso imaginar. É uma história de luto, de perda de uma ilusão, uma espécie de engano de pessoa tardio, com o agravante de estarem ligados pela filha (agravante, por um lado; atenuante por outro, já que foi um sonho realizado seu, de se tornar pai).
A descoberta do narcisismo de alguém em quem se investiu tanto traz sempre sentimentos conflitantes: uma raiva descomunal… e ao mesmo tempo, uma perplexidade enorme.
Como funciona essa cabeça narcisista? A intuição te mostra que não houve malícia, má intenção naquele comunicado horrível. A outra nem se deu conta de como estava te ferindo. Aos olhos dela, ela estava apenas sendo honesta.
Ao mesmo tempo, sua história contrapõe dois perfis masculinos clássicos: o “papai” (você, capaz de acolhimento e consideração) e o “cafajeste” (o cara; no caso, o pior tipo de cafajeste, o Don Juan das falsas promessas).
Há um cuidado adicional: verifique se há repetição de finais infelizes em seus relacionamentos amorosos, pois você estaria vivenciando algo que se chama de neurose de transferência: a atração fatal por narcisistas, com a esperança (fadada ao desastre) de convertê-los em pessoas capazes de te apreciar.
Se for esse o caso, seria preciso examinar sua história de aprendizado afetivo, pois a neurose de transferência conta o que está inscrito em nosso complexo de Édipo.
quarta-feira, 24 de abril de 2024
A INEFICIÊNCIA DO DRAMA
O paciente entrou no Miguel Couto andando, mas com uma faca cravada no olho, até o cabo. As pessoas viam aquilo e gritavam, outras desmaiavam…
Ele chegou à sala de atendimento, o médico olhou para ele, pediu para que ele dissesse se sentia as mãos, ele disse que sim. Em seguida, o médico pegou o cabo da faca e tirou-a fora. O paciente ficou bem.
Perguntado como pôde ser tão frio, o médico respondeu: “Nós não estamos aqui pra fazer drama; estamos para resolver problemas”.
Essa lição da ineficiência do drama me ficou, já lá se vão 54 anos dessa cena. Mas foi lidando com a psicanálise do Superego que a coisa fez mais sentido para mim: o drama não serve para resolver problemas; ele serve para dar um sentido tal de horror e urgência, que a única resposta é a reação, nunca a reflexão.
Por isso o drama é a arma preferida dos tiranos, por isso o drama é a arma preferida de nosso tirano interno: o Superego.
Veja na política: quando a ditadura argentina estava por um fio, o general Leopoldo Galtieri, o tirano de então, inventou de tomar posse das ilhas Falklands. Isso! Ele inventou um drama de guerra para “unir a Argentina” sob seu comando, e se manter no poder.
Eficiência? Nenhuma. Argentinos morreram e as Falklands continuaram com a Inglaterra. Galtieri ganhou alguns meses de sobrevida.
O Nicolas Maduro começou a trilhar o mesmo caminho, querendo pôr a Venezuela em guerra com a Guiana. Os exemplos não faltam. O drama nunca resolvendo o problema, mas… mantendo a ditadura.
Sendo assim, um dos instrumentos fundamentais da psicanálise do Superego é NÃO FAZER DRAMA de nada. Nada é um horror; nada é um escândalo; ninguém é um monstro assustador; apenas a doença é objeto de análise… e o Superego faz parte do problema, não da solução.
Ela examina com cuidado a faca, para poder retirá-la com segurança e serenidade.