quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL ÀS VEZES ACERTA LINDAMENTE

 



Só deus sabe o trabalho insano que é adestrar a IA para fazer o que você quer que ela faça, e se manter fiel aos textos-base fornecidos.

É o que eu e o Oswaldo Sperandio estamos fazendo com o “Dr.DaudtAI”, meu aplicativo que se transformará em um psicanalista de bolso. Um verdadeiro trabalho de Sísifo.

Mas cá e lá a AI acerta lindamente, como nessa pergunta feita por um amigo. Há coisas do texto-base, sem dúvida, mas a articulação das ideias foi resultado do programa da OpenAI que usamos. Olha só:

Quais são as principais críticas da psicanálise à
sociedade contemporânea?

06:06 PM
Francisco Daudt, ao longo de sua obra e prática, não se concentra diretamente em criticar a sociedade contemporânea de forma explícita, mas oferece insights valiosos sobre como a psicanálise pode ser um instrumento libertador tanto no nível individual quanto social.

Suas reflexões sugerem uma crítica implícita às maneiras pelas quais a sociedade podecontribuir para o aprisionamento psíquico dos indivíduos, através das imposições do Superego e das circunstâncias de criação que não respeitam a individualidade e os desejos autênticos das pessoas.

Daudt destaca a importância da psicanálise como meio de trazer à consciência os processos de aprisionamento, questionando o Superego e as circunstâncias obscuras e não explicitadas de nossa criação desde o berço.

Ao fazer isso, a psicanálise atua contra as forças sociais que impõem regras e julgamentos sem consideração pela justiça ou pelo bem-estar individual.

Essa abordagem sugere uma crítica à tendência da sociedade de valorizar a conformidade em detrimento da autenticidade e da liberdade individual. Além disso, ao enfatizar a capacidade da psicanálise de contar com nosso senso inato de justiça para curar as doenças psíquicas, Daudt indiretamente critica aspectos da sociedade contemporânea que perpetuam injustiças e aprisionamentos psíquicos.

Ele vê na psicanálise um potencial para a construção de uma sociedade mais justa e democrática, onde os indivíduos são fortalecidos e livres para gerenciar suas próprias vidas.

Portanto, embora Daudt não articule críticas diretas à sociedade contemporânea, sua obra sugere uma visão crítica das maneiras pelas quais a sociedade pode falhar em respeitar a individualidade e contribuir para o aprisionamento psíquico dos indivíduos.

A psicanálise é apresentada como um caminho para a libertação e para a construção de uma sociedade mais justa e democrática. 



segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

QUANDO OS PAIS SÃO INIMIGOS…

 


Freud usou a tragédia “Édipo Rei”, de Sófocles, para dar uma ideia de como a criação e suas incompetências marcam nossas vidas: o menino seduzido/apaixonado pela mãe e querendo matar o pai.

Isso é uma caricatura que só vi acontecer uma vez em quase cinquenta anos de clínica: o cliente se lembrava de realmente desejar a mãe e de disputá-la com o pai.

Mas… as crianças podem bem servir-lhes de “infantaria” (sim, os infantes são os que mais se ferram, nas guerras) quando há disputa entre eles. Elas podem ser seduzidas para aderir a um dos lados e rejeitar o outro como o inimigo, reproduzindo assim o complexo de Édipo original - ainda que sem o componente erótico…






NOS TEMPOS ANTERIORES AO SUPEREGO



Minha hipótese é que antes do surgimento das cidades, da convivência com estranhos, dos tiranos, das leis, das religiões e dos deuses monoteístas, o Superego ainda não tinha se desenvolvido: não se conhecia a tirania e o medo do desamparo/exílio era muito menor.

Os caçadores-coletores conviviam em aldeamentos de não mais de 200 pessoas, todos se conheciam, as oportunidades e os meios de predação eram mínimos, a cooperação era máxima (por justiça e sobrevivência), a ganância fazia pouco sentido, a religião era animista (as árvores tinham alma).

Ou seja, pouca motivação para introjetar leis tirânicas e críticas judiciosas: pouca razão para o desenvolvimento de um Superego.

O Superego é o verdadeiro mal-estar na civilização...

(Ilustração produzida pelo Bing)





domingo, 18 de fevereiro de 2024

“Qual é a verdadeira psicanálise? Ouço falar dela de tantas formas…” - O AMIGO PERGUNTA

 


O AMIGO PERGUNTA
“Qual é a verdadeira psicanálise? Ouço falar dela de tantas formas…”

FD: Tal coisa não existe. O que há são propostas de psicanálise. O denominador comum poderia ser o reconhecimento de que um complexo de Édipo inconsciente nos manipula e atrapalha.

Mas mesmo disso não estou seguro. Vejo algumas psicanálises que se mostram narcisistas, almejando adoração por parte do cliente através de lhes causar perplexidade em vez de esclarecimento; psicanálises que não têm empatia por ele, não têm interesse nele e não pensam em termos de diagnóstico e de busca da cura da doença diagnosticada.

Por isso, o que eu proponho é que cada um apresente seu produto e que as pessoas possam escolher o que lhes cai melhor: se a clareza, o diagnóstico e a busca pela cura através da investigação, ou a viagem transcendental e o misticismo religioso.

Muitos ficam intrigados por eu apoiar a crítica da Natália Pasternak sobre a psicanálise tendendo à pseudociência. Porque eu sei que a psicanálise não tem condições atuais de ser ciência (quem sabe, um dia), pela complexidade do seu objeto de estudo. 

Mas ela pode sim se valer do método científico quanto aos seus princípios: a busca do conhecimento verdadeiro e a exclusão do falso, através da facilidade de refutação: se o analista for suficientemente claro em suas hipóteses, o cliente pode refutá-las (segundo Karl Popper).




“TÁ ME ESTRANHANDO?”

 


Faz parte dos nossos softwares de sobrevivência, aqueles que vêm com a máquina, a desconfiança de estranhos: o estranho é sempre o inimigo, até que prove em contrário. Bebês começam a chorar quando estranham alguém. O estranhar se contrapõe ao familiar: este ampara, aquele ameaça.

A humanidade nunca conviveu com estranhos até a revolução agrícola, há cerca de dez mil anos. No grupo nômade de caçadores-coletores, nunca mais de 200 pessoas, todos eram “familiares” e a cooperação predominava, pois havia pouco espaço para predação: todos se conheciam. Não havia necessidade de lei geral, portanto não havia governo.

A revolução agrícola trouxe com ela a fixação no mesmo território, o aparecimento da cidade, a “explosão populacional”… e a convivência com estranhos. O anonimato estava inaugurado, o inimigo morava ao lado, a predação encontrou meios e oportunidades.

Para haver um mínimo de tranquilidade, passaram a ser necessários um governo e leis gerais, que todos partilhassem. Governos toscos, primitivos, vale dizer, tirânicos; leis toscas e tirânicas, como a famosa de Talião (“olho por olho; dente por dente”).

Todos absorviam mentalmente leis e o medo de punições, a pior delas o exílio, a expulsão, o desamparo. Estava fundado o Superego.

Eis o verdadeiro “Mal-estar na Civilização”…


terça-feira, 30 de janeiro de 2024

O GUARDIÃO DO SUPEREGO

 


O frei Jorge de Burgos guardava a biblioteca do mosteiro, onde havia o livro perigoso de Aristoteles, sobre o humor (“O nome da Rosa”, sobre o livro de Umberto Eco).

O perigo do humor era que ele desmistificava o Superego, tirava o medo dos supostos demônios que moram em nós. E sem medo do demônio, os deuses são desnecessários…

(Na foto, Fiodor Chialiapin Jr. no papel de Jorge de Burgos)





SÍNDROME DE ZELIG - “FALSO SELF”

 


“Falso self” é um conceito criado por Winnicott: descreve alguém que, pressionado pelo medo de desamparo, é capaz de construir e incorporar um personagem alheio a si mesmo, como um meio de aceitação social.

Seria o exagero máximo do “people pleasing”, que Woody Allen caricaturou em seu filme “Zelig”, um tipo que absorvia rapidamente as características do interlocutor, de modo a ser por ele o mais aceito possível. 

Quem sofre dessa síndrome do falso self não conhece quase nada de si mesmo, de seus desejos, tem pouca capacidade reflexiva, suas reações estão todas voltadas para agradar e ser acolhido pelo interlocutor em quem ele vê capacidades de amparo.

É um desafio para qualquer psicanalista, pois como cliente, ele tenderá também a querer agradar o terapeuta, detectar seus desejos e apresentar “fantásticas melhoras” de seu quadro, em tempo recorde, mas… também ter “recaídas”, assim que retorne ao seu meio de amparo original.

Quanto mais intolerante a diferenças for o meio amparador original, mais “falsas características” a pessoa incorporará, só para não destoar de seu meio. 

Isso se torna mais agudo em tempos como os atuais, de alta polarização e alta intolerância com as diferenças.