segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

NOS TEMPOS ANTERIORES AO SUPEREGO



Minha hipótese é que antes do surgimento das cidades, da convivência com estranhos, dos tiranos, das leis, das religiões e dos deuses monoteístas, o Superego ainda não tinha se desenvolvido: não se conhecia a tirania e o medo do desamparo/exílio era muito menor.

Os caçadores-coletores conviviam em aldeamentos de não mais de 200 pessoas, todos se conheciam, as oportunidades e os meios de predação eram mínimos, a cooperação era máxima (por justiça e sobrevivência), a ganância fazia pouco sentido, a religião era animista (as árvores tinham alma).

Ou seja, pouca motivação para introjetar leis tirânicas e críticas judiciosas: pouca razão para o desenvolvimento de um Superego.

O Superego é o verdadeiro mal-estar na civilização...

(Ilustração produzida pelo Bing)





domingo, 18 de fevereiro de 2024

“Qual é a verdadeira psicanálise? Ouço falar dela de tantas formas…” - O AMIGO PERGUNTA

 


O AMIGO PERGUNTA
“Qual é a verdadeira psicanálise? Ouço falar dela de tantas formas…”

FD: Tal coisa não existe. O que há são propostas de psicanálise. O denominador comum poderia ser o reconhecimento de que um complexo de Édipo inconsciente nos manipula e atrapalha.

Mas mesmo disso não estou seguro. Vejo algumas psicanálises que se mostram narcisistas, almejando adoração por parte do cliente através de lhes causar perplexidade em vez de esclarecimento; psicanálises que não têm empatia por ele, não têm interesse nele e não pensam em termos de diagnóstico e de busca da cura da doença diagnosticada.

Por isso, o que eu proponho é que cada um apresente seu produto e que as pessoas possam escolher o que lhes cai melhor: se a clareza, o diagnóstico e a busca pela cura através da investigação, ou a viagem transcendental e o misticismo religioso.

Muitos ficam intrigados por eu apoiar a crítica da Natália Pasternak sobre a psicanálise tendendo à pseudociência. Porque eu sei que a psicanálise não tem condições atuais de ser ciência (quem sabe, um dia), pela complexidade do seu objeto de estudo. 

Mas ela pode sim se valer do método científico quanto aos seus princípios: a busca do conhecimento verdadeiro e a exclusão do falso, através da facilidade de refutação: se o analista for suficientemente claro em suas hipóteses, o cliente pode refutá-las (segundo Karl Popper).




“TÁ ME ESTRANHANDO?”

 


Faz parte dos nossos softwares de sobrevivência, aqueles que vêm com a máquina, a desconfiança de estranhos: o estranho é sempre o inimigo, até que prove em contrário. Bebês começam a chorar quando estranham alguém. O estranhar se contrapõe ao familiar: este ampara, aquele ameaça.

A humanidade nunca conviveu com estranhos até a revolução agrícola, há cerca de dez mil anos. No grupo nômade de caçadores-coletores, nunca mais de 200 pessoas, todos eram “familiares” e a cooperação predominava, pois havia pouco espaço para predação: todos se conheciam. Não havia necessidade de lei geral, portanto não havia governo.

A revolução agrícola trouxe com ela a fixação no mesmo território, o aparecimento da cidade, a “explosão populacional”… e a convivência com estranhos. O anonimato estava inaugurado, o inimigo morava ao lado, a predação encontrou meios e oportunidades.

Para haver um mínimo de tranquilidade, passaram a ser necessários um governo e leis gerais, que todos partilhassem. Governos toscos, primitivos, vale dizer, tirânicos; leis toscas e tirânicas, como a famosa de Talião (“olho por olho; dente por dente”).

Todos absorviam mentalmente leis e o medo de punições, a pior delas o exílio, a expulsão, o desamparo. Estava fundado o Superego.

Eis o verdadeiro “Mal-estar na Civilização”…


terça-feira, 30 de janeiro de 2024

O GUARDIÃO DO SUPEREGO

 


O frei Jorge de Burgos guardava a biblioteca do mosteiro, onde havia o livro perigoso de Aristoteles, sobre o humor (“O nome da Rosa”, sobre o livro de Umberto Eco).

O perigo do humor era que ele desmistificava o Superego, tirava o medo dos supostos demônios que moram em nós. E sem medo do demônio, os deuses são desnecessários…

(Na foto, Fiodor Chialiapin Jr. no papel de Jorge de Burgos)





SÍNDROME DE ZELIG - “FALSO SELF”

 


“Falso self” é um conceito criado por Winnicott: descreve alguém que, pressionado pelo medo de desamparo, é capaz de construir e incorporar um personagem alheio a si mesmo, como um meio de aceitação social.

Seria o exagero máximo do “people pleasing”, que Woody Allen caricaturou em seu filme “Zelig”, um tipo que absorvia rapidamente as características do interlocutor, de modo a ser por ele o mais aceito possível. 

Quem sofre dessa síndrome do falso self não conhece quase nada de si mesmo, de seus desejos, tem pouca capacidade reflexiva, suas reações estão todas voltadas para agradar e ser acolhido pelo interlocutor em quem ele vê capacidades de amparo.

É um desafio para qualquer psicanalista, pois como cliente, ele tenderá também a querer agradar o terapeuta, detectar seus desejos e apresentar “fantásticas melhoras” de seu quadro, em tempo recorde, mas… também ter “recaídas”, assim que retorne ao seu meio de amparo original.

Quanto mais intolerante a diferenças for o meio amparador original, mais “falsas características” a pessoa incorporará, só para não destoar de seu meio. 

Isso se torna mais agudo em tempos como os atuais, de alta polarização e alta intolerância com as diferenças.






domingo, 14 de janeiro de 2024

O QUE É A CONSCIÊNCIA

 


A nossa espécie ganhou o nome de “homo sapiens sapiens” porque Linæus a designou como o “homem que sabe que sabe”, características da autoconsciência, algo único entre as espécies. 

O “saber que sabe” é a consciência que nos interessa, a Freud e a mim. Ela não é um teatro, nem um filme, pois seu conteúdo não visual é imenso, apesar de ela poder ser conceituada como “o olho que vê para dentro”. 

Neste momento, p.ex., não há conteúdo visual para mim, apenas os conceituais, que me impulsionam para responder essa questão da maneira mais legal que posso.

A consciência lida o tempo todo com arquivos de memória, e ela os liga através da bússola do desejo (busca de prazer). Então, somos impulsionados pela busca do prazer (essa é a força do DNA, que nos leva à reprodução) para gerenciar nossos arquivos de memória com a finalidade de… nos causar mais prazer (ou arranjar jeitos de evitar desprazeres). 

É o que vejo sendo a consciência: uma ferramenta a mais para a reprodução/busca de prazer/sobrevivência.



PANDEMIA DE MIMADINHOS, LINHA DE MONTAGEM

 


Freud aponta os pais como origem dos traumas de seus clientes. Quando esses se tornam pais, morrem de medo de que seus filhos venham a falar mal deles com seus futuros analista. Como consequência, abrem mão da coisa mais importante na criação dos filhos, a AUTORIDADE. Passam a bajuladores dos filhos. Resultado: mimadinhos.

Marx divide o mundo em opressores e oprimidos. Os partidos comunistas ocupam todas as vagas de possíveis de professores, educadores e mídia, dentro das escolas e fora delas. O exemplo mais próximo de opressores que as crianças têm são seus pais. Ao mesmo tempo, é extremamente sedutora a posição de oprimidos, de coitadinhos, de vítimas, pois a manipulação do sentimento de culpa é fonte de muito poder. Quando esses filhos se tornam pais, morrem de medo de serem vistos como opressores. Como consequência, abrem mão da coisa mais importante na criação dos filhos, a AUTORIDADE. Passam a bajuladores dos filhos. Resultado: mimadinhos.

Lembrando: quando o assunto é governo, a ditadura é menos má que o caos, a falta de AUTORIDADE,  o caos é o pior cenário, mas… a democracia dá de dez!