Agora o Superego está instalado… mas não completo. O processo de adestramento que o formou vai continuar a construção dele, em um processo de “machine learning” semelhante ao usado pelas inteligências, tanto a artificial (I.A.) quanto a natural: aperfeiçoamento através de dados novos e correção dos antigos.
O seu princípio básico de funcionar com modelos inalcançáveis (“seja um santo; seja um gênio; seja fodão”) e antimodelos assustadores (“não erre; não seja ingrato; não tenha raiva de seus pais; não seja merda etc.”), e operá-los na base da chantagem (“senão… já sabe: desamparo”) e dos choques (vergonha, medo, angústia, culpa) já está instalado, e não se desinstalará nunca mais: mesmo que enfraqueça percentualmente, não chegará a zero.
- (Não é uma equação sem saída: as crianças podem absorver princípios éticos e de bom funcionamento através de virtudes ensinadas como vantagens para ela; mais tarde, o poder do Superego diminuirá, se aprendermos a ouvi-lo como algo em nós, e a discutir suas leis).
Mas ele ainda conta com um truque para se manter no poder: a naturalização. Assim como tiranos sugerem que eles são investidos pelos deuses para governar, que tudo sempre foi assim, que isso é “natural”, o Superego conta com nossa incapacidade de estranhamento: nenhuma criança que nasceu vendo tartarugas verdes andando pelo teto vai achar aquilo estranho. Elas simplesmente não têm como estranhar o Superego, muito menos questioná-lo. Ele passará despercebido… e como natural.
Não é seu único truque de manutenção da tirania. O outro é a sedução: “Confunda-se comigo e você será tão poderoso quanto eu!”, diz ele. “Faça com seu irmãozinho o que fizeram com você! Cause-lhe terror de desamparo!”
Mais tarde, em um outro ambiente em que o Superego costuma ser reforçado (a escola), a criança olhará o bully como um novo tirano poderoso, e ficará tentada a se identificar com ele, a fazer bullying com algum colega mais fraco.
É o “passa diante, senão vira elefante!”, uma brincadeira perversa dos meus tempos de escola: você levava um cascudo do colega da carteira de trás, e quando virava para reclamar, ele dizia a frase fatal. Naquela hora, sem saber, você estava seduzido para operar como Superego do colega em frente.
Sem saber, você estava se confundindo, por sedução, com seu próprio Superego!