“Quais dos habituais truques de psicanalista você usa em sua clínica? Silêncio prolongado? Interpretações prontas? ‘Neutralidade’? Mistério? Distância formal? Desmascaramento das intenções ocultas, daquelas que fazem o cliente chorar? Joguinhos de poder?”
Francisco Daudt: Meu único “truque” é não ter truques, muito menos joguinhos. Entendi, com o tempo (e revisitando a época em que estive do outro lado do balcão/divã), que esses truques mencionados só servem para afirmar o psicanalista como superior e idealizado, ou seja, eles põem o analista na posição do Superego do cliente. Eles repetem, na relação analista-cliente, o jogo fodão-merda que todos temos com nosso próprio Superego.
Disso resulta que o vício sadomasoquista do fodão-merda não é investigado no cliente, pois o próprio analista nem o vê, por estar incorporado nele a partir de suas instituições formadoras. A doença s&m fodão-merda é o principal ponto cego da enorme maioria dos psicanalistas.
Por ter ciência disso, e por saber bem meu lugar de prestador de serviços para o cliente, posso ter a postura humilde e transparente de recebê-lo com afabilidade e bom humor, sem dramas, ouvi-lo com compaixão, nunca interpretar nada, simplesmente investigar e apresentar minhas hipóteses para sua avaliação: sempre facilmente rejeitáveis, se ele as confirmar, haverá muita chance de estarem corretas.
Basicamente, o “truque” é o método científico. E a ciência contém ignorância humilde, com muita vontade de saber. Saber sobre a saúde do cliente, e entender bem o que a atrapalha.