domingo, 18 de julho de 2021

CIÊNCIAS EXATAS: HERANÇA ISLÂMICA?

 



Venho escutando esse papo de que devemos aos árabes a matemática, a astronomia e todas as ciências exatas, inclusive os algarismos que usamos se chamam "arábicos", e aposentaram os romanos por sua praticidade. Mas sempre desconfiei da história dele. Consultei meu pesquisador favorito, o advogado brasileiro Hamilton de Freitas, que mora no Porto, Portugal. Abaixo, o resultado de sua pesquisa:

"É besteirol. Os gregos e os hindus fizeram todo o trabalho. Os árabes, na expansão pós-Maomé, em meio aos saques, massacres e catequeses pela espada, pegaram obras, compilaram, traduziram para o árabe. A maioria dos intelectuais que fez esse tipo de descoberta e difusão foi perseguida. Nem os algarismos eles inventaram. Foram os hindus. Os algarismos que HOJE todo o mundo usa (MENOS OS ÁRABES) foi criado por um italiano: o Fibonacci..."



domingo, 4 de julho de 2021

TRANSGRESSÃO E MUDANÇA DE COSTUMES - O AMIGO PERGUNTA

 


TRANSGRESSÃO E MUDANÇA DE COSTUMES
De Adrilles Jorge: “Como distinguir  na “ perversão “ um avanço ou um problema pra civilização ? A civilização nasce da renúncia em alguma medida do desejo , certo ? Como um psicanalista diz a um paciente o que é lícito ou não moralmente dentro da regra social  do seu tempo ? Um pedófilo pode argumentar que tirar a camisa na praia já foi um atentado ao pudor como fazer sexo com criança . Um psicanalista deve se abster de juízos morais sempre ?”

Francisco Daudt: Vamos lá, que a pergunta é complexa. Primeiramente, um reparo: a perversão é uma doença estabelecida, com compulsão, repetição, aluguél mental etc. 

O que eu afirmei ser transformador dos costumes é a transgressão não compulsiva, que se rebela contra regras e costumes que parecem injustos.

Civilização vem de “civis”, aquele que vive na cidade, o cidadão. A cidade surgiu com a agropecuária, há dez mil anos. Com ela, veio uma novidade para a espécie: a convivência com estranhos. Até então, o caçador-coletor vivia em tribos onde todos se conheciam… e todos se vigiavam, para restringir a predação e estimular a cooperação. 

Conviver com estranhos requereu leis, e um governo com monopólio da violência para impô-las. Essas leis derivavam do ethos (a ética, o não causar danos) e do morus (a moral, que contempla os costumes não danosos), e deveriam fazer o que a vigilância da tribo fazia outrora: restringir a predação. Só. Infelizmente, o estímulo à cooperação ficou como a nossa maior perda, na transição.

Esta perda da cooperação estimulada é a principal causa do “mal-estar na civilização”, pois que a vigilância para contenção dos predadores sempre existiu. A dupla anterior era “coibição do vício com estímulo à virtude”; passou apenas a coibição do vício.

Para agravar a coisa, a forma de governo mais “natural” é a tirania: dê muito poder a alguém, e haverá abuso, opressão. Como resultado, o mal-estar era maior, pois as proibições eram tirânicas e atendiam principalmente ao… tirano.

Há 2.400 anos, surgiu uma esquisitice: a democracia. Ela pretendia que as leis surgissem da conversa e do convencimento (parlar, parlamento), e não da simples vontade do governante. Isso gerou leis mutáveis e mais respeitosas com as pessoas. Houve significativa diminuição do mal-estar.

A psicanálise, se quiser ser curativa das doenças e das perversões, não tem saída senão ser engajada na ideologia democrática. Ela própria é uma terapia da palavra, do parlar, do parlamento, do convencimento… e não da tirania.

Ela precisa defender a democracia interna da mente: não haverá tirania; nem do Id, nem do Superego. Eles precisam se conhecer e conversar entre si, para que o Ego exista, e não fique massacrado entre as duas potestades.

Todas, e eu repito, TODAS as doenças vêm da tirania mental, uma instância em guerra de poder sobre as outras, e o Ego (eu, você) no meio, sofrido (nas neuroses) ou abduzido (nas perversões).

Quem aparece no consultório é o Ego sofrido. Ninguém vai se tratar sem conflito íntimo. A pessoa pode até ter perversões, mas não está confortável com elas. Portanto, o psicanalista não precisará ser juiz, nem censor, nem acusador, nem repressor. 

Ele pode exercer bem seu papel de advogado de defesa de seus clientes, para entender seu sofrimento, sua prisão, sua opressão.


“Por que o alcoolismo é considerado doença?” - O AMIGO PERGUNTA

 


De Marta Krieger: “Por que o alcoolismo é considerado doença?”

Francisco Daudt: Vamos lá. O alcoolismo preenche as características que definem uma doença psíquica, a saber: 

compulsão (é mais forte que a pessoa), 
repetição (ocorre todos os dias),
grande aluguel mental (a pessoa só pensa “naquilo”)
redução da capacidade, da liberdade (a pessoa se torna prisioneira),
deterioração/decadência psíquica (e física), 
satisfação imediatista, mas com dano de médio/longo prazo 
(no caso do alcoolismo, além de perda de emprego, acidentes de carro, abusos domésticos, leva a outras doenças e a eventual morte).




VÍCIO OU DOENÇA? - O AMIGO PERGUNTA


VÍCIO OU DOENÇA?
“Você fica falando em vício, mas o alcoolismo não é vício, é doença, certo?”

Francisco Daudt: Os dois, doença e vício. É verdade que, como o vício tem má fama, há quem se ofenda com o termo. Cabe esclarecimento, pois.

O vício é um tipo de doença muito particular. Não se pode fazer nada diante da Covid (exceto a prevenção) ou da apendicite: delas seremos sempre passivos. 

Já com o vício, não: ele contém uma fração de arbítrio, de escolha nossa, ainda que pequena, sobretudo depois de instalado. Ele é uma doença que relutamos em reconhecer como nossa (é muito mais fácil vê-la nos outros).

Tanto que, para combatê-la, é necessário admitir-se portador, é indispensável tomar para si o gerenciamento de sua cura, é mandatório deliberar a cada dia se vamos investir nela ou dela nos afastar.
Essa é a diferença.



 

VÍCIOS E SEUS GANHOS - O AMIGO PERGUNTA

 


VÍCIOS E SEUS GANHOS

“Eu entendo o ganho de prazer em vários vícios comportamentais, mas… qual é o ganho do masoquismo?”

Francisco Daudt: Bem, no masoquismo sexual ele é óbvio: o castigo e a dor liberam da culpa e permitem o gozo. Há uma “satisfação ao superego”, um pedágio pago.

Já no masoquismo sutil, muito comum nas relações familiares (casais, pais e filhos) e no trabalho (assédio moral), há ganhos também sutis:

1. a nobreza do martírio: a cultura judaico-cristã enobrece o sacrifício (o feito sagrado), por aí a pessoa pode se sentir intimamente engrandecida, moralmente superior.

2. A vingança sutil: ao aparecer como a vítima sofredora, o agressor será visto – pelos outros – como um canalha.

3. O culto do coitadismo: ao enaltecer seu sofrimento, a pessoa pode pleitear ganhos indenizatórios. Essa modalidade tem se tornado uma política de grupos minoritários, atualmente. Apesar de haver justiça na base dessa luta, a linha que divide o uso do abuso, o pleito justo e a ambição de se tornar opressor, é também sutil.

4. Mas é preciso lembrar que o primeiro ganho desse masoquismo é ter-se evitado o confronto: por medo, ou pela culpa de se ter raiva de alguém muito importante para nossa sobrevivência (um pai, um patrão et al.)

É por isso que a psicanálise vê o combo sadomasoquismo nunca separado em dois grupos estanques: a pessoa pode ser manifestadamente sádica e sutilmente masoquista… e vice-versa.



“Como se tratam os vícios? Têm cura?” - O AMIGO PERGUNTA

 


VÍCIOS 2

“Como se tratam os vícios? Têm cura?”

Francisco Daudt: Vício não tem cura, mas… pode-se viver muito bem sem eles.

É preciso saber que a predisposição ao vício de substâncias é genética. Os filhos devem ser avisados de que herdaram o gatilho, que se cuidem bem.

Uma senhora de setenta anos quis se divorciar: “Meu marido é alcoólatra e me bate”. “Quantos anos a sra. tem de casada?”. “Cinquenta”. O marido, filho de alcoólatras, passou a vida evitando o álcool. Aposentado, foi convencido pelos amigos que “agora ele podia se dar a esse direito”. Desenvolveu alcoolismo em dois anos…

Seja de substâncias, seja de comportamento, os vícios são tratados com um princípio geral (reconhecimento de se ter a doença, para poder gerenciá-la) e duas estratégias básicas: desinvestimento/abstinência do vício; investimento nas virtudes.

Sobre o princípio geral: não adianta acusar, nem vigiar, nem punir; se a própria pessoa não se reconhece dominada pela doença, nada, NADA vai adiantar. Nem vergonha, nem culpa, nem internação, nem remédios. Nada. A pessoa precisa ser a gerente de seu vício, da busca de sua cura, é sua única chance.

Sobre as estratégias: reconhecida a doença, vem a pergunta: que perspectivas de vida virtuosa (ética, bela, construtiva, autônoma, independente) tem a pessoa? É preciso que as haja. Se não estiverem à vista, é preciso buscá-las.

A saída de um vício deixa um buraco na alma, uma falta de sentido, um vazio social/afetivo, pois que os cúmplices se parecem muito com amigos. É necessária a substituição de uma coisa por outra; outros círculos sociais, outras companhias, outras amizades que não se baseiem no vício.

A abstinência: todo viciado em substância passa um tempo verificando se realmente tem que ir para o “substância-zero”, ou se pode “usar um pouquinho”. Ele próprio precisará descobrir a resposta, mesmo que na enorme maioria das vezes o “substância-zero” seja o destino.

Já no caso dos vícios comportamentais, a abstinência é mais difícil. Como todos eles se baseiam numa ilusão de superioridade, numa crença na ideologia fodão/merda, numa tentação de se sentir fodão a cada momento, o cultivo da virtude precisa ser simultâneo. Que virtude? A humildade. O saber-se falho, o aceitar-se incompleto. O apreciar-se em construção. O ter metas de se fazer melhor (melhor, veja bem; não “superior”).

O papel do psicanalista: nunca acusar, nunca humilhar, nunca culpar. Apoiar a luta, ser seu parceiro, descobrir capacidades e potenciais virtuosos do cliente. Entender e investigar as circunstâncias históricas e as circunstâncias-gatilho.

Mostrar como seu cliente foi envolvido e seduzido por elas. Ajudá-lo a identificá-las e previni-las.



“O vício é falta de vergonha na cara?” - O AMIGO PERGUNTA

 


VÍCIOS

“O vício é falta de vergonha na cara?”

Francisco Daudt: Não é. O vício é uma doença, e a tentativa de fazer com que a pessoa o abandone através do sentimento de culpa ou de vergonha é o maior tiro no pé que se pode dar. A culpa/vergonha são tão incomodas, que levam o viciado a eliminá-las… com mais uma dose.

Chama-se de vício à repetição compulsiva (“mais forte do que eu”) de algum ato que dá satisfação imediata, mas que se sabe errado, ou prejudicial aos nossos principais interesses. Quando há uma momentânea restrição interna, a pessoa diz, “ah, foda-se, vou fazer!”.

Há os vícios óbvios de substâncias que dão prazer imediato, e infelizmente entre elas estão os carboidratos. O que separa o uso do abuso, o hábito do vício, é o dano (daí o “dane-se”) aos principais interesses da pessoa.

E há os vícios comportamentais, como a hipocondria, a cleptomania, e o mais comum de todos: o fodão/merda.

O f&m é uma variante sutil do sadomasoquismo. É curioso, porque enquanto o sadomasoquismo, aquele sexual das botas e chicotes, é bem raro, já esses maltratos entre casais, com um humilhando o outro em público (em privado também, claro), são muito frequentes.

Eu os tomo como o exemplo mais claro do jogo fodão/merda: um parceiro, inseguro em sua autoestima, intimamente se achando um merda, encontra alívio momentâneo posando de fodão ao humilhar o outro, ao dizer que “merda é ele”.

Mas esse comportamento não se restringe aos casais. De jeito nenhum, ele é a praga psicológica que mais se espalha na atualidade. A compulsão de apontar os defeitos dos outros para se engrandecer, para obter alívio de sua condição de merda, atinge até presidentes da república: pense no Donald Trump…