“O que pode haver de erótico na boca de uma mulher anestesiada?”
Francisco Daudt: Nada. Afora o estímulo sensorial, o orgasmo desse caso não vem do erotismo, e sim do extremo da transgressão. Há a adrenalina do risco pelo desafio ao Superego, não só o interno, mas à sua representação externa: a sociedade, a equipe médica e enfermagem, a violação do juramento de Hipócrates, o sagrado da maternidade etc.
O Marquês de Sade costumava se masturbar diante de um crucifixo, desafiando a imagem com blasfêmias (“Se você existe, me mate agora, seu porco!”) e finalmente chegando ao orgasmo com uma gargalhada: “Está vendo? Eu venci! Você não existe!” Não há melhor exemplo de que o prazer, ali, vinha do desafio e da vingança, não do erotismo.
Como nada do que é humano nos é estranho, Nelson Rodrigues uma vez reclamou: “Quem são esses loucos que querem abolir o pecado, na prática sexual? Eles vão matar grande parte de sua graça!” De fato, quanto mais proibido e transgressor é o sexo, mais ele se afasta do sexo pessoal, mais ele se aproxima do fetiche e da masturbação. E a masturbação é a principal vida sexual dos homens.
“Peccato che non sia peccato” (“é uma pena que não seja pecado”), diz-se em italiano, lamentando que uma comida deliciosa não tenha esse “tempero extra” da transgressão, esse bônus de prazer…
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