domingo, 14 de agosto de 2022

“O REPRIMIDO RETORNA?” - O AMIGO PERGUNTA

 



“O que é esse tal de retorno do reprimido?”

Francisco Daudt: O retorno do reprimido é menos complicado do que parece. Suponha um pensamento incômodo sobre alguém. Você varre da consciência, “não quero pensar nisso”, mas ele não desaparece da sua cabeça. Volta e meia ele dá notícias. E você varre de novo.

Isso, numa coisa boba. Vamos aumentar a gravidade um pouquinho: você tem aquele encontro agendado, mas há uma ambivalência em relação à pessoa em questão. Você quer, e também não quer. Mas já agendou, já está comprometido. Aí a ambivalência retorna de uma forma mais esquisita: você perde o compromisso, pois se esqueceu totalmente dele. O retorno se deu de forma disfarçada, substituída: é o ato falho.

Vamos aumentar a gravidade mais ainda: você depende do seu pai, ele é a fonte de amparo na sua vida, mas… ele é injusto e cruel com você, muitas vezes, e isso desperta em você uma raiva (que você não chama de raiva, chama de mágoa, desconforto, ressentimento; chamar de raiva seria muito forte). A ameaça de desamparo é tão grande, que esses desconfortos somem de sua mente: aí sim, se deu uma repressão. O retorno desse reprimido vai se dar de forma ainda mais esquisita: o sintoma neurótico. Você tem pensamentos invasivos de outra natureza, tem sonhos estranhos e repetitivos, você desenvolve uma fobia a baratas ou aranhas, você tem crises de pânico, você tem ritos obsessivos aprisionantes.

A cara do sintoma não se parece nem um pouco com a raiva reprimida, mas ele retorna e retorna, podendo tomar outras formas mais complexas: a paixão neurótica por alguém com características do seu pai, como se você quisesse corrigir a história, só que a pessoa se parece tanto (naquele aspecto injusto) com ele que em vez de haver correção, o que existirá é repetição.

Você acaba encontrando sucessores do seu pai pela vida afora: é o retorno do reprimido…






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