Aposto que, quando você leu o título desta postagem, pensou que eu ia falar contra os preconceitos, certo? Pois isso foi um preconceito seu.
É impossível viver sem preconceitos. O simples fato de você achar que está entendendo o escrito aqui, já é um preconceito: você está transferindo seus conceitos do significado das palavras ao texto que escrevo… e eu poderia estar chamando urubu de “meu louro”.
O preconceito mais comum da espécie, aquele que tem salvado a vida de milhões ao longo do tempo, é o que diz “se é estranho, é inimigo”. Você abriria mão desse preconceito ao andar por uma rua deserta à noite, ouvindo passos em sua direção?
Se o estranho começa a aparecer com sinais familiares, o preconceito muda de direção: passa a ser preconceito a favor. Mas continua preconceito.
Qualquer aparição pública minha é cuidadosamente pensada para que eu desperte preconceito a meu favor: maneira de falar, de vestir, de cortar o cabelo e aparar a barba. Ou aqui, meu jeito de escrever, a ilustração que escolho para a postagem etc.
Meu filho trouxe um colega de jiu-jítsu para almoçar. Foi quando me dei conta de que um negro entrava em minha casa como convidado social. Durante o almoço, esqueci que ele era negro, pois virou Samuel.
A criminalização do racismo é necessária, porém não suficiente. A culpabilização do preconceito racial é má estratégia, por conter injustiça (estranho/inimigo). O problema não é ter preconceitos, o problema é tê-los pétreos: quanto mais negros virarem Samuel, mais preconceitos a favor competirão com os outros em nossa cabeça, mais flexíveis nossos preconceitos serão, diante das evidências.
P.S. : Tenho consciência de que meu texto pode despertar uma chuva de preconceitos contra mim, tão delicado é o tema.
Mas corro o risco. Tenho um preconceito sobre a inteligência dos meus leitores: é a favor…
(Na imagem do post: Sidney Poitier, em “Advinhe quem vem para jantar”, 1967. Poucas pessoas fizeram mais para diminuir o preconceito racial do que Sidney Poitier: ele era o Samuel em pessoa!)
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