O “Valor Econômico” me pede uma entrevista. O tema: “E se o Brasil fosse seu paciente?”
Apesar de eu só ter pacientes que procuram tratamento por se verem com problemas (eu não atendo pessoas em que só os outros veem problemas; respondo sempre, “agora que me conhece, quando você achar que precisa de ajuda, sabe o caminho”); apesar – por essa mesma razão – de saber do tamanho da minha impotência para ajudar, desejo sim olhar o Brasil e pensar em seu sofrimento, que é o meu também.
Tristeza, depressão e vício, os males do Brasil são. A tristeza vem de um tipo difícil de luto: o de gente viva. Como aquele grande amor que nos largou, vivemos entre a saudade e a esperança. A esperança, nesses casos, é uma coisa esquisita: às vezes ela é a última que morre; outras vezes, a primeira que mata.
Ariano Suassuna disse que não era um otimista, pois o otimista é um tolo; nem um pessimista, pois o pessimista é um chato; queria ser um realista esperançoso.
Tá difícil, Ariano, tá difícil. Olhamos o Brasil e dizemos, “o que será que eu vi nessa pessoa?” Outra hora, “ah, não, vai melhorar...” É assim que a esperança tem nos alentado e maltratado.
A depressão, como todas, é resultado da angústia prolongada. Nossa angústia vem do medo da sifudência e da raiva impotente, não carece de explicação. Seus sintomas são apatia, desalento e irritabilidade, esta última sendo o sintoma menos reconhecido da depressão. Há pessoas muito ativas que passam a vida puxando briga com pipoqueiro, e não se reconhecem depressivas.
Então vem o vício. Assim como depressivos usam álcool como remédio, muito antes de procurar ajuda, os vícios distraem e aliviam momentaneamente, fazem esquecer das dores e mágoas, mesmo que cobrem alto preço mais adiante. Infelizmente, quem está sofrendo não pensa em mais adiante: a farpa exige alívio já, a dor empurra para o imediatismo.
O vício que assola o Brasil é o tribalismo fodão/merda. A política do “nós contra eles”, que vem sendo cultivada há anos, ganhou o impulso das mídias sociais para se tornar guerra viciosa: a dopamina (neurotransmissor do prazer) que inunda o cérebro a cada vez que xingo, humilho, rotulo o outro de merda, se torna nossa dependência, nossa razão de viver.
A micro-vitória da minha tribo, conseguida às custas da derrota da tribo oposta – e isso é um fenômeno mundial, não é exclusivo nosso – faz com que percamos as referências de uma identidade nacional e nos afunda na lama da doença cada vez mais, aumentando a tristeza, a desesperança e a depressão... que nos impulsionarão para mais vício.
Ou seja, é um círculo vicioso...
“Mas, e a cura, doutor?” Como em qualquer doença, a prioridade é a parte mais grave e mais danosa. No caso do Brasil, o vício. A primeira coisa, os AA já recomendam há tempos, é reconhecer-se doente.
É este o propósito da minha mais que modesta – porém esperançosa – contribuição aqui.
A CRIAÇÃO ORIGINAL - A TEORIA DA MENTE SEGUNDO FREUD
Disponível em: https://7letras.com.br/livro/a-criacao-original/
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