sábado, 6 de março de 2021

TENTANDO ENTENDER O CAPITÃO. 2


Em resposta ao Ricardo Rangel
TENTANDO ENTENDER O CAPITÃO. 2

Quase um ano depois, volto ao assunto. Desta vez, por uma provocação do Ricardo Rangel, que escreveu sobre o impulso de morte que dominaria o capitão.

Como o impulso de morte é uma das hipóteses freudianas mais enigmáticas, e das que mais me intrigaram, acrescento aqui o que já pensei sobre ela e como ele se aplica, a meu ver, ao capitão.

Diferentemente do que acontece em outras espécies, a morte é um assunto para a nossa. Sabemos que ela nos espera, inescapável como os impostos. Isso produziu em nós um complexo de inferioridade básico: vivemos tentando negá-la, “superá-la”, racionalizá-la. Pirâmides, religiões, cruzadas, “legados”, a “imortalidade” da Academia, enormes feitos foram engendrados para nos afirmar maiores do que ela.
Infelizmente, não são apenas as belas construções que a negam. Estas são resultado de inteligência e de perseverança: se não a evitam, podem melhorar a vida, trazendo-lhe beleza.

Não. Um meio mais simplório de afirmar-se maior é o reverso de construir: a destruição. Desde o imbecil que se acha fodão porque pixou a cúpula da Candelária e se tornou um “herói” na tribo de seus pares, até as diversas formas de assassinato: gangues, guerras, suicídio (a afirmação máxima de controlar a morte, ainda que ele vá da eutanásia ao mais lamentável de todos, o suicídio de vingança), o fuzilamento dos inimigos, o linchamento, e em termos mais atuais, o cancelamento.

Pode-se dizer então que, quanto mais primitiva e tosca a mente, mais simplória será a solução de se afirmar não-merda, de se dizer maior: aniquilar o adversário. 

A democracia é uma construção complexa e permanente. A tirania sempre foi o governo mais simplório e primitivo. Convencer é complexo; vencer é simplório. Divergir no debate é complexo; prender/matar o divergente é simplório.

O grande lamento de Nelson Rodrigues (“os imbecis dominarão o mundo; não pela qualidade, mas pela quantidade: eles são muitos”) era pela forte suspeita de que a democracia possa ter sido um ponto fora da curva, um acidente na história da humanidade.

Agora reviso nas entrelinhas a postagem de abril de 2020:

Ruth de Aquino, em artigo, defendeu que ele é psicopata, e não louco. Creio que ela acerta um pouco, mas erra muito, principalmente por simplificação. 

A meu ver, a encrenca do capitão é uma soma, uma mistura de:
a) burrice tosca complexada, desses que se percebem burros e negam isso de forma agressiva, em permanente atitude de defesa, por se sentirem sob permanente ataque/crítica.

b)  um atroz e invejoso ressentimento da inteligência e da cultura alheias, ao ponto de ver a razão e a ciência como inimigas, e crer que sua opinião prevalece sobre fatos.

c) perversão sadomasoquista semelhante à do Trump, do tipo fodão-merda, que precisa de constante afirmação/adulação para combater sua insegurança, precisa de uma tribo de seguidores fanáticos para se apoiar, precisa compulsivamente de apontar os outros como merdas para se sentir fodão (com a diferença de que Trump não é burro, é principalmente fodão-merda); 

(Nota: já dá para perceber que o único projeto de governo do capitão é se reeleger. Ele vê que não sabe governar e não governa, só ocupa seu tempo em campanha, brigando e tentando virar ditador.)

d) sim, algum grau de psicopatia, mas não elevado. Um bom psicopata não se sente ameaçado como ele se sente, basta vê-lo no pronunciamento público ao despedir o Mandetta. Ele parecia vidrado, meio atemorizado mesmo; de jeito nenhum estava frio como um psicopata estaria.

(Nota: outros sinais de medo são o destempero histérico, a coprolalia e o sumiço diante da prisão do Queiroz.)

O capitão parece acreditar nas besteiras/inverdades que diz, diferentemente de Trump ou Lula. Ele parece crer que seu passado de atleta o imuniza contra a Covid etc. Isso faz com que ele soe realmente sincero e autêntico, como seus seguidores dizem. 

Já Trump e Lula mentem com gosto, com o gozo de quem sabe que está fazendo os outros de idiotas. Isso sim, é coisa de sociopata/psicopata.

Enfim, me esforço por entender a complexidade desse fenômeno da democracia representativa, pois que ele realmente representa um significativo percentual da população, daqueles que sempre se sentiram ressentidos e humilhados pela suposta superioridade intelectual das esquerdas (o “politicamente correto” foi fator de irritação anti-esquerdas na eleição dele e na de Trump) e veem no capitão sua revanche.




 
 A CRIAÇÃO ORIGINAL - A TEORIA DA MENTE SEGUNDO FREUD



 

Um comentário:

  1. Dr. Daudt, Gostaria de lhe perguntar sobre dois supostos transtornos - paralelamente à psicopatia e à sociopatia (moderadas, conforme o que entendi de seu diagnóstico psicanalítico) - que parece caracterizarem o comportamento do Capitão da reserva e infelizmente Presidente da República.
    Um desses transtornos, segundo a psiquiatria (DSM V) poderia ser o TDAH. O outro, hipoteticamente, poderia ser o transtorno desafiador opositor (TDO, idem).
    Não sou da área da saúde e, portanto, a minha pergunta inscreve-se nas preocupações de um professor, intrigado com estes transtornos em seus alunos e familiares.

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