terça-feira, 24 de novembro de 2020

Artigos: Zonas Erógenas

 O Manuel perguntou ao amigo Joaquim:

— Ó Joaquim, tua mulher transa contigo, é pur amore, ou é pur interesse?

Depois de uma pausa pensativa, Joaquim respondeu:

— Ó Manél, deve ser pur amore, pois que ela não mostra o menor interesse…

Quando alguns amigos souberam que eu ia escrever sobre o título, me disseram que ele era batido. Eles têm razão. “Só não contavam com a minha astúcia” para citar o Chavez da TV, por quem tenho admiração. Do outro tenho asco.

Pois minha intenção é pegar o mote para falar sobre o que vai acontecendo na vida dos casais, principalmente depois que vêm os filhos. Sobretudo numa transformação que se passa na mulher, que é origem freqüente das depressões pósparto.

Vamos começar com as mulheres. É freqüente que, ao lhes nascer o primeiro neném, caia-lhes na cabeça uma supraidentidade que as deixa tontas: “Agora eu não sou mais a Mônica, eu sou uma Mãe”. A Mônica era uma garota alegre, sapeca, gostava do esporte, tanto que ela e o Eduardo viveram uma paixão tórrida, do tipo “bicho pega”, até que se casaram e logo engravidaram.

Três meses de enjôo. Ela não queria nem olhar para o Eduardo, quanto mais para o tal do “bicho”. Ainda mais que o obstetra havia dito para eles maneirarem, pois era um tempo delicado, dando assim uma monumentalidade à gravidez e jogando o casal de marido e mulher ainda mais para o segundo plano.

Pois é aí que entram as tais zonas erógenas de que eu queria falar. Quem esperou as tais áreas anatômicas tão batidas vai ficar aliviado. Leia a historinha a seguir:

Há um filme (Sex education) em que os filhos de Ed Harris, preadolescentes, resolvem contratar uma prostituta para que ela lhes ensine os truques eróticos de enlouquecer uma mulher. O filme tem um final feliz, com o pai se encantando pela moça, e os filhos fazendo uma pergunta definitiva: “Existe um ponto na mulher que, se tocado, ela é levada à loucura?”. E Melanie Griffith responde: “Sim, existe”. E aponta o coração.

Eros, assim como a Philia e o Ágape, é uma das formas de amor que os gregos descreveram, tomando o nome de um deus (“graças a ele, os homens conheciam as alegrias da amizade, as doçuras da ternura, os prazeres e as dores que acompanham o amor verdadeiro”- Nova mitologia clássica; Mario Meunier, 1976), portanto as zonas erógenas – geradoras de Eros – de que estarei tratando aqui, são áreas mentais de produção de amor.

Quem salvará Mônica do peso da maternidade? Quem lhe ensinará que a moleca não morreu? Quem dirá ao Eduardo que o casal só precisa de ajuda para continuar um casal?  Que existe transa mais calma que o “bicho pega”, com notas mais ternas, mais carinhosas, talvez mais acolhedoras para o momento de fragilidade. Que a Mônica não virou santa intocável porque está se adquirindo uma nova condição (que não anula as anteriores). Que escola de medicina ensinará o obstetra que ele não é o proprietário da “gestante”, que não deve olhar para o marido como um intruso, mesmo se ele conhece Mônica desde que ela era uma garotinha, e que Eduardo é, sim, mais importante do que ele, e que se houver realmente alguma razão médica que impeça a transa, existe sempre o chamego, e o chamego dá prazer ao coração.

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Material publicado na Folha de São Paulo.

(Publicado em 11 de junho de 2012)


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