(Publicado em 01 de fevereiro de 2012)
Sou hétero e depressivo crônico. Meu melhor amigo é mais velho, e, apesar de ter se casado duas vezes e ter filhos, prefere homens. Nunca experimentei ser amado como o sou por ele, que me acolhe paternalmente, me protege e cuida de mim como ninguém jamais cuidou. Existe amor incondicional?
Não. Qualquer relação humana supõe ganhos recíprocos. Se não os houver, ela se dissolverá. A coisa mais parecida com amor incondicional é o que temos por nossos filhos, mesmo assim há os ganhos afetivos de fazê-los felizes, eles que são nossos projetos. Vocês não têm troca erótica, como você diz em sua carta. Mas têm algo em comum: o handicap. Você, por depressão crônica, sua limitação afetiva e necessidade de cuidados. Ele, por um objeto de desejo quase impossível (homem hétero, mais jovem, belo, inteligente interlocutor, delicado, capaz de acolhê-lo e de se interessar por ele, desejoso de ser cuidado e de ser passivo na troca erótica).
Ou seja, vocês dois nasceram com uma perna só. O que parece é que se dão conta dessa limitação e, como os estóicos, não vivem se lamentando dela, mas buscam a felicidade com ela. Aposto que ele está feliz com você, pois é o melhor que poderia encontrar na vida. Faltam 20% (a troca erótica) para o preenchimento de seu desejo? “Dane-se”, dirá ele, “nunca imaginei que fosse encontrar 80%!” Você não lhe deve nada, nem ele a você. Sejam felizes.
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